quinta-feira, 1 de novembro de 2012

COLUNA UM - Os gastos em Cultura e a falta de lupas

 
 
COLUNA UM -  Os gastos em Cultura e a falta de lupas
 
 Portuguesinho que sou, e habituado,  dificilmente «habituado» mas mesmo assim habituado / rotinado nestes últimos tempos a procurar distinguir entre aquilo que é o comunicado e aquilo que é o feito e em que águas se move aquilo que é comunicado - para pelo menos tentar saber o «valor» do comunicado na sua relação com a realidade profunda - deparei-me há já alguns dias (desde o dia 3 de Fevereiro) com a anúncio feito pela Secretaria de Estado da Cultura de S. Paulo do seu Programa Cultural para o Ano 2009.
 
 Como S. Paulo (estado e cidade) são mais ou menos iguais em termos populacionais com o país que é Portugal, achei curioso procurar alguns pontos de encontro entre os dois embora sabendo também que a organização política e administrativa dos dois países é diferente e que diferente será a orçamentação.
 
 Mas nem em tudo as coisas serão liminarmente diferentes, porque nós aqui em Portugal também contamos com um Governo Federal (a União Europeia) e para o que me interessa desenvolver neste plano as minhas análises e ilações  têm todas as condições para serem explicadas e desenvolvidas.
 
O Brasil não deixa de me surpreender e embora tenha tido sempre bastante ligação com o Brasil, não só por razões históricas, não conhecia e continuo a não conhecer as particularidades deste grande país.
 
Mas o ser humano é «grosso modo» igual em todo o Mundo e uma aldrabice dita em português de raiz e feita em Portugal e uma aldrabice dita em português do Brasil (ou brasileiro como se entender mais próprio) e feita no Brasil não deixa, para todos os efeitos, de ser uma aldrabice apenas variando a sua posição geográfica.
 
Indo à questão e analisando com os meios disponíveis a Programação Cultural para 2009 no Estado de S. Paulo verifiquei que nem uma santa alminha nesse país irmão se lembrou de ir ver o Orçamento do Estado de S. Paulo para tentar pelo menos saber qual o volume e o impacto da anunciada e bastante difundida Programação dentro de tal orçamentação. Se por acaso alguém o fez (não quero os direitos de autor como é claro) isso não apareceu nem nos órgãos de comunicação nem nesse imenso universo blogueiro que segue a par e passo o andamento do mundo.
 
Universos esses que, relacionados com a Cultura, têm em princípio alguma massa crítica em stock. Nada! Nada encontrei e não foi por falta de esforço e nem por falta de tempo. Entre a data do anúncio e hoje vão quase dois meses = 60 dias = 60 edições. Pois bem, o Orçamento do Estado de S. Paulo destina para o sector cultura em 2009 a bonita soma de 743,7 milhões de Reais; se formos a comparações com outros sectores  orçamentados pelo Estado SP. veremos que não é assim tão bonita, mas não é esse o meu objectivo nem o meu espaço neste jornal.

Ora, e com algum esforço, consegue-se «apanhar» nesta programação cultural para 2009 do Estado de S. Paulo mais de 10% e menos de 20% dessa verba orçamentada. O Proac (Plano de Acção Cultural) que se distribui entre os agentes culturais e cuja descrição se junta foi «instituído pela Lei nº 12.268 de 20/2/06, tem por objetivo apoiar e patrocinar a renovação, o intercâmbio e a divulgação da produção artística do Estado, bem como preservar e difundir o seu patrimônio cultural material e imaterial. Em 2008, o Programa de Ação Cultural lançou 25 editais de apoio a projetos culturais no Estado de São Paulo, totalizando um investimento de R$18 milhões de reais no setor.
 
Também em 2008, o Programa de Ação Cultural recebeu centenas de projetos para o patrocínio dos contribuintes do ICMS – Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Sobre Prestação de Serviços de Transportes Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação. Foram aprovados 252 projetos, e liberados R$ 50 milhões para a captação, em áreas como Dança, Museu, Circo, Eventos Carnavalescos, Rádio e TV e Patrimônio Histórico.»
 
Ou seja, o Proac gasta 20  (29%) milhões em editais e dá 50 (71%) milhões aos respondentes aos tais de editais de 10% do Orçamento do Estado para a Cultura e abarca sob a sua capa tudo aquilo que se pode ler acima, desde o património físico ao não físico. Só como exemplo em 2008 este programa de verbas mais ou menos semelhantes «deu» a excelente soma de 4 milhões de Reais para a a produção de 4 telefilmes e premiação de 10 roteiros de filme para TV. E aparentemente toda a gente ficou satisfeita com os 0,72 % do «bolo» global de cerca de 550 milhões de Reais no ano. É preocupante...
 
Para mim é preocupante, embora se possa dizer que não tenho nada a ver com isso. E é preocupante porque não estamos a falar de gente analfabeta onde tudo aquilo que viesse à rede era bom peixe. Estamos a falar de entidades, instituições, pessoas que trabalham com a CULTURA. Que têm a obrigação de ser CULTOS. Têm a obrigação de ver as coisas, de questionar.
 
Quando se perde ou não se usa a faculdade de questionar o ser humano perde um pouco da sua essência.

Daniel Teixeira

Publicado pela primeira vez no Jornal Raizonline nº 9 de Fevereiro de 2009

 

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