terça-feira, 5 de março de 2013

COLUNA UM - Sobre a Especificidade e a Globalização.

 
 
COLUNA UM - Sobre a Especificidade e a Globalização.
 
 O Acas, (a seguir nesta coluna), fez o favor de responder ao meu convite para que nos falasse sobre o que é ser-se caipira, o que sente, vive e motiva um caipira que o faz ficar caipira.
Em certo sentido tentei que ele me explicasse as razões de fundo do seu orgulho em afirmar-se caipira.  Nunca pretendi como parecerá evidente, ver no caipira um ser estranho a este mundo de modernidade, a este mundo de nivelamento cultural e linguístico, enfim ao mundo em que vivemos.
 
Isto apesar de alguma simplificação comparada (comparamos sempre tudo com tudo) nos levar facilmente a pensar que o caipira é o mesmo que o nosso habitante do interior português, o agricultor de antigamente a soldo dos latifundiários (tipo criado de servir como braço de trabalho e as mulheres também como serviçais) ou da pequena agricultura de sobrevivência, onde existia (e existe) uma relação com fortes laivos de feudalismo - normalmente traduzidos pelo termo compadrio - onde acontecem, nestes tempos de democracia (pelo menos virtual) algumas cumplicidades entre poderosos e «ex-criados» que ultrapassam pelo absurdo tudo aquilo que um defensor da «luta de classes» julgaria possível.
 
Os exemplos mediáticos nesta nossa terra são muitos e podemos falar de Felgueiras, Adelino Ferreira Torres, Alberto João Jardim e todo um manancial que por uma razão ou outra pouco conhecido do grande público é.
 
Mas existem outras relações de solidariedade entre pessoas de classes e condições económicas mais ou menos diferenciadas que não se ficam pela cumplicidade «malandra» e são antes resultantes do respeito mútuo por regras de convivência seculares que não são forçosamente resultado de outras imposições senão as que resultam de uma vivência e de uma história comuns.
 
Afinal, tudo depende dos homens, tudo depende das pessoas. Tudo depende de casos concretos, tudo depende da especificidade que se tem em análise.
 
Numa altura em que todos os povos - e neste momento os mais reparados são os europeus entre os quais neste caso se acentuam os portugueses - são englobados na ideia da mundialização do pensar, num momento em que as próprias tecnologias nos empurram para procedimentos comuns, nivelados, em que o ser «normal» obedece quase a um figurino que se pretende que seja tão único quanto é possível, a afirmação das identidades torna-se trabalho de muito poucos e resistência passiva de muitos.
 
Em certo sentido condenada pela história em andamento a especificidade e a defesa dela começou de forma mais evidente a ser «limada» nos seus pontos mais fracos e o hábito, a cultura, o falar local são seguramente pontos fracos em qualquer sociedade que ficarão como motivo folclórico para turista ver como vai acontecendo todos os dias desde há muito tempo com os povos todos.
 
Teremos nós culpa disso, ou seja, teremos nós achado que era pouco significante que o índio brasileiro, o africano tribal, o ilhéu de Dobu se «civilizassem» à nossa maneira e estaremos nós agora a «pagar» pela nossa desatenção no passado ? Não sei se as coisas não seriam sempre assim qualquer que fosse a nossa atitude...porque de uma forma ou de outra ela aí está e veio para ficar: a globalização cilindrará pura e simplesmente tudo aquilo que destoe do pensar que se vai tornando cada vez mais comum a um maior número.
 
Estamos pois condenados a não ser diferentes e a sermos menos nós - e que não se entendam estas palavras como sendo uma manifestação de derrotismo. É antes a constatação de uma realidade que todos sabemos ser demasiado real.
 
Os portugueses que lêem o Acas quando ele se refere a Portugal, quando ele refere as grandes vantagens de se estar na União Europeia, quando ele fala daquilo que se diz pelo menos em certos estratos da população brasileira sobre a riqueza e a fortuna de se estar na U. Europeia e sobre aquilo que é Portugal actualmente, os portugueses sabem que a imagem que de nós se cria não correspondendo de todo à realidade mas também têm de saber que é assim que as ideias se implantam: manda primeiro o imaginário o manto da ilusão e mostra-se a realidade por si mesma depois. É um processo imparável e infalível...

   Daniel Teixeira
Janeiro de 2009

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