quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

A História Interminável do Diário de Irene IV

A História Interminável do Diário de Irene IV

A Ilha dos Narigudos é uma ilha pobre, sem actividade turistica, que não consta nos roteiros de viagens e da qual a Irene apenas poderá ter ouvido falar através de alguém que a conheça. Ora quem teria falado da Ilha dos Narigudos à Irene é uma questão para a qual procurei encontrar resposta. Pessoa pouco ou nada letrada é de supôr que ela não tenha feito uma pesquisa bibliográfica tal como eu fiz, embora o facto de sofrer daquele mal do nariz enorme fosse, para uma outra pessoa, um ponto de partida viável. Mas eu não conseguia conceber tal comportamento pesquisador na Irene que eu conhecia.

Com uma história interrompida agora (desde o início do Sec XX) de disputas infelizes pela sua posse, a Ilha dos Narigudos está inserida numa zona que foi centro de tráfego de escravos que eram transportados pelos negreiros em condições mais que desumanas, e “despejados” quando morriam por esse mar fora, terra onde flibusteiros e piratas “descansavam” das suas surtidas e onde, melhor ou pior,o povo da Ilha dos Narigudos sempre procurou sobreviver tal como o faz agora.

Razões de localização geográfica e a dificuldade de acesso fizeram com que a Ilha dos Narigudos acabasse por praticamente ser abandonada aos seus nativos desde o início do Sec. XX, voltando estes à sua cultura tradicional quase por inteiro. Mas os arquivos, quer os espanhóis, quer os britânicos quer os franceses guardaram um pouco da sua história naquilo que pode ser considerado o período de visibilidade da Ilha dos Narigudos.

Diga-se que esta ilha está envolta em alguma poesia e mesmo algum mistério, tal como o seu descobridor. É assim que é relatado o primeiro contacto com ela : “ Por volta das cinco da manhã do dia 3 de Novembro de 1493, há 517 anos, um vigia a bordo da caravela Mariegalante avistou uma forma alta e verde no horizonte. No norte do percurso da nau erguia-se uma alta falésia no topo da qual o vigia da nau disse ter visto alguns indígenas com enormes narizes. Era um domingo, e Cristovão Colombo decidiu dar a essa terra, descoberta na sua segunda viagem ao Novo Mundo, o nome de Ilha dos Narigudos, em homenagem à capacidade de observação do vigia.

Mas, a tripulação não conseguiu encontrar, ao longo da acidentada costa exposta ao vento, um local apropriado para fundear e seguiu em direcção ao Norte, sem atracar; ficou-lhe, contudo, uma indelével imagem da ilha. Um membro da expedição relatou num assomo de lirismo: "A Ilha dos Narigudos é notável pela beleza das suas montanhas e pela quietude que emana da sua verdura; é preciso vê-la para acreditar ”.

No seu regresso a Espanha, Colombo descreveu a ilha a Fernando e Isabel através da imagem de uma folha de papel amarrotada, que colocou diante deles. O vigia foi chamado para descrever os habitantes que tinha visto e relatou-os como sendo de pequena estatura, com grandes narizes e como estando completamente nús. Disse ainda que dançavam e que jogaram do alto do penhasco à passagem da nau "muitas lanças que se perderam no mar".

Esta é a parte histórico-romântica da Ilha dos Narigudos que só viria a ser aprofundada e clarificada aquando da "febre" antropo-biológica que se seguia às teses de Charles Darwin. Alguns antropólogos e etnólogos esquecidos hoje pelas enciclopédias tiraram referência da Ilha dos Narigudos talvez a partir dos relatos de Colombo perguntando-se se o processo evolutivo sugerido por Darwin era assim tão linear como ele o descrevia.

Na verdade, se havia um processo evolutivo comum a toda a humanidade onde encaixavam os narigudos? Na sua maior parte os pongídeos, dos quais se diz ter derivado o homem, são reconhecidos pelo seu nariz curto, um nariz mesmo amolgado para dentro, como se tivessem levado um soco demolidor. Ora, por esta lógica, seriam os narigudos da Ilha dos Narigudos a excepção que subvertia a regra darwiniana?

Estaria o Charles (Darwin) a gozar com a ciência e com a religião, por arrasto, uma vez que esta com a sua tese do Adão e Eva e do criacionismo fora a que mais se ressentira da descoberta darwiniana? E por outro lado, teriam os escribas conventuais subvertido a história da Ilha dos Narigudos de forma a, pelo menos, descredibilizarem Darwin?

Por outro lado, e tendo por referência os factores ambientais que se acreditava moldarem as características das espécies, o que teria levado a que os narigudos fossem narigudos? Que factores odoríferos tinham influido para que se tivesse verificado o aumento do apêndice nasal? E porque razão tal tinha acontecido (?) ou o que havia naquela ilha que tornasse necessário um aumento da potencialidade de captação dos odores projectando o nariz para fora e não fazendo-o aperfeiçoar-se nas suas potencialidades intra-cranianas.

De esclarecer que estamos a comentar conhecimentos imberbes de uma (na época) ainda mais imberbe da ciência...

(Continua)


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